sábado, 7 de janeiro de 2012

a vida..

a mãe, com as pernas inchadas, mal se conseguia movimentar. deitada na cama, não parava de pedir algo que lhe pudesse aliviar as dores. o filho, na casa dos trinta anos, com aspecto de manequim, não a largava. amparou-a até à casa de banho e mudou-lhe a fralda. o aspecto dele era sofrido. trincava os lábios para tentar segurar as lágrimas que lhe queriam à força cair dos olhos. angústia e revolta. a senhora tentou comer a sopa, mas não demorou muito a mandá-la fora. a maçã assada, cortada aos poucos pelo filho, foi o que ela conseguiu manter no estômago. o marido entrava e saia da sala a todo o momento. a dor de ver alguém, de quem se gosta, naquele estado, estava a consumi-lo. a cara vermelha, os olhos húmidos, o abanar a cabeça em gesto de reprovação.

o senhor deitado na cama. a normalidade da cara pálida. a senhora sentada ao seu lado. mãos que se entrelaçam, num gesto de conforto e de presença. os olhos fechados do senhor, a cabeça baixa da senhora. a dor que os une. a notícia de que o senhor teria que ficar internado. os olhos que se abrem, a cabeça que se ergue. os olhares que se cruzam. as mãos mais apertadas. o choro incontrolável ao deixar o marido e ter que ir.

o choro compulsivo de quem perdeu alguém. os gritos que nos ferem a pele. o deitar no chão. os abraços que deixam os ombros molhados. a dor. o sofrimento. a vida. sobretudo isto. a vida!